terça-feira, 7 de setembro de 2010

o caso da herança Fèteira



CONTINUA A ESPECULAR-SE EM TORNO DE QUESTÕES MARGINAIS

Quando estalou o escândalo da herança Fèteira, publiquei o que tinha como provado em relação aos primeiros anos da evolução do Lúcio Fèteira, que o levou à condição de um dos homens mais ricos do mundo.
Tudo o que publiquei resulta da memória de homens que estão à beira do centenário e não oferece qualquer dúvida quanto à sua veracidade, seja quanto à ida do Lúcio para a Legião Estrangeira, à sua passagem pelo partido comunista e pela presidência da junta de freguesia de Vieira de Leiria, a abertura e o encerramento estudados da fábrica da Guia, o título de cônsul do Paraguai e ao seu envolvimento num atentado e à fuga posterior no hidravião.
Nada disto oferece dúvidas.

A partir daqui,. a versão que eu conheci originalmente vai para duas décadas, sendo difícil obter-lhe hoje elementos comprovatórios, vale ainda assim um registo. Tem a ver com o que escrevi então sobre dois aspectos ainda hoje obscuros:
- Terá o Lúcio Fèteira estado envolvido num tentado contra Salazar?
- Houve ou não o beija-mão da família Fèteira ao ditador, na sequência do envolvimento do Lúcio no hipotético atentado e da sua fuga no hidroavião?

A primeira questão irá continuar envolta em controvérsia até ao final da história. De facto, o único atentado contra o ditador ocorreu em 4 de julho de 1937, logo depois de ter estalado a guerra civil espanhola, tendo todos os seus pormenores sido assumidos por Emídio Santana, anarco-sindicalista. E mesmo que se admita que uma certa característica individualista que caracterizava os militantes desta causa e que os levava a procurar protagonismo acima de tudo (veja-se a acção na véspera do 18 de janeiro de 1934 na central eléctrica de Coimbra então localizada na rua Figueira da Foz), parece de todo improvável que o Lúcio se metesse com este gente.
Resta então a hipótese de o comprovado envolvimento na tentativa de atentado contra o ministro da Indústria, ter intenções de ir mais além, ter ocorrido dez anos depois.
Sendo hipótese não assumida pelos seus contemporâneos, não deixa de ter alguma lógica. A qual seria a de o Lúcio Fèteira, depois de ter acertado com o Cunha e o pistoleiro contratado a forma como seria concretizado o atentado contra o ministro, ter mudado de ideias e decidido que o alvo seria o próprio Salazar.
Tudo vai continuar envolvido em brumas. O certo é que a acção contra o regime em que o nome do Lúcio Féteira pode ser envolvido, como financiador em associação com Cupertino de Miranda, é o levantamento militar de 10 de abril de 1947 nos quartéis de Tomar, Tancos e Entroncamento, falhado por falta de colaboração do restante dispositivo militar, falhanço esse que atrasou por quase três décadas a queda do regime fascista.

E é na sequência desse factos e da fuga do Lúcio que surge a segunda grande dúvida. Sabendo-se que os Fèteiras eram escora fundamental do dito "Estado Novo", e não sendo o Lúcio um dos quatro irmãos mais velhos a quem o pai confiou a propriedade da empresa, onde só entrou mais tarde por ter comprado a quota de um dos irmãos, como terá reagido a família ao envolvimento do delfim? Houve mesmo audiência de desagravo, o falado beija-mão?
O mistério vai prosseguir, mas há uma coisa que ninguém pode esconder que é o facto de um dos seus irmãos ter sustentado publicamente a teoria de que o Lúcio tinha sido recolhido na aldeia do Pilado pouco depois de ter nascido, em consequência de uma das graves crises de fome que caracterizaram a passagem do século XIX para o século XX, e que ao regressar poderá ter sido trocado. Conta-se que até foi dito, em socorro desta teoria, que haver um lenhador nos pinhais com as características físicas dos Fèteiras e esse sim seria o verdadeiro Lúcio! A falta que nos faz hoje Alexandre Herculano para pôr estas lendas no seu devido lugar.
Portanto, se houve ou não beija-mão dos Fèteiras a Salazar, é assunto que vai continuar no segredo dos deuses. Certo é que a ter acontecido a audiência, o ditador ao ouvir esta desculpa deve ter sorrido para dentro, anuído por conveniência e pensado lá para com os seus botões "è disto que o meu Portugal precisa".





ps1: A razão porque o Lúcio, que não foi destinado para "dono" da fábrica, coisa reservada pelo pai Joaquim Fèteira para os quatro irmãos mais velhos, e a forma como ele se sobrepôs a eles de tal forma que no centenário da empresa é ele que vai discursar na presença de ministros e embaixadores e depois de ter regressado da famosa fuga, terá origem no facto de ao Lúcio ter sido proporcionada a oportunidade de ir estudar para o Externato Correia Mateus, cujo edifício ainda existe.
ps2: Certa comunicação social continua a agarrar este assunto pelas questões marginais, o que só pode ser explicado por estar em causa muito dinheiro.